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Por Instituto Escolhas
23 julho 2025
4 min de leitura
Transição dos sistemas alimentares exige ampliação da assistência técnica, dizem especialistas

A Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) tem um papel fundamental na transição da agricultura brasileira para modelos de produção mais sustentáveis e adaptados aos desafios da crise climática. Essa é a opinião de especialistas reunidos em webinar nesta terça-feira (22) para discutir estudo recém-lançado pelo Instituto Escolhas que mapeou a presença da ATER em normas legais e políticas públicas federais no Brasil.
De acordo com o levantamento, há hoje 92 leis, normas e políticas federais que citam a ATER como instrumento de implementação, em atividades econômicas como a agricultura, a pecuária e o manejo florestal, entre outras. O número não inclui instrumentos legais que regulamentam especificamente a política pública de ATER, como a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural para a Agricultura Familiar e Reforma Agrária – PNATER.
Ao abrir o webinar, Jaqueline Ferreira, diretora de Pesquisa do Instituto Escolhas e coordenadora do levantamento, destacou que, apesar de o marco legal brasileiro reconhecer a relevância da ATER, destacada pela Constituição, “ela não é tratada necessariamente como prioritária por sucessivos governos” e “não recebe a devida atenção em termos de esforços e recursos”. Lembrou que a grande maioria dos agricultores familiares (82%) não recebe o serviço, segundo o Censo Agropecuário realizado pelo IBGE.
Marenilson Batista da Silva, diretor executivo do Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural (Dater) do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar (MDA), lembrou que os recursos destinados à ATER caíram substancialmente entre 2016 e 2022, mas voltaram a crescer a partir de 2023. Reconheceu, porém, que o orçamento do setor “ainda não é o desejado”.
Silva listou avanços feitos por seu departamento nos últimos anos, entre eles parcerias com outras pastas e com Estados, investimentos em pesquisa e reforço da participação das mulheres e dos jovens nas iniciativas de ATER. E destacou que o fortalecimento de uma agricultura mais sustentável é um dos objetivos principais. “Hoje, no MDA, todas as ações que fazemos com nossos parceiros vão para agroecologia e para a transição ecológica”, disse.
Luciano Brandão, representante da Associação Brasileira das Entidades de Assistência Técnica e Extensão Rural, Pesquisa Agropecuária e Regularização Fundiária (Asbraer), afirmou que, “quando se desenha política pública, todos reconhecem a importância da assistência técnica e extensão rural para levar adiante essa política”. O problema, disse, é que esquecem do principal, a necessidade de recursos para viabilizar essa política. “Não tem como falarmos em transição alimentar, mitigação climática, combate à fome sem ter orçamento para isso.” Segundo Brandão, é preciso um reforço da contribuição federal para a ATER. “Hoje, quem está arcando com essas políticas públicas são os Estados.”
Para Lilian Rahal, secretária nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), orçamento é, claro, “um problema”, mas “quando se tem políticas bem desenhadas, dá para executá-las mesmo com pouco orçamento”.
Ao destacar a importância dos agentes de assistência técnica e extensão rural, Rahal afirmou que os indicadores do ministério mostram que programas como Fomento Rural e Cisternas têm muito mais eficácia quando acompanhados da ação desses profissionais. E o trabalho deles começa bem cedo, com a identificação dos “invisíveis do campo”, famílias mais vulneráveis que podem se beneficiar das políticas oficiais de ATER.
Clérison dos Santos Belém, coordenador institucional do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (IRPAA) e membro do grupo gestor da Rede Ater Nordeste, destacou o caráter educacional da assistência técnica. “A ATER é um serviço de educação. Um serviço essencial.” Afirmou que esse trabalho junto ao agricultor familiar precisa ser sempre direcionado para a agroecologia e que se trata de um “processo coletivo”. Para ele, é preciso ter a população como “protagonista”, para que “não crie uma dependência do extensionista”.
Belém destacou a importância das organizações sociais nas políticas de ATER no semiárido nordestino e citou o exemplo da construção de cisternas. “Quando a gente faz uma cisterna, não é só uma construção civil. A gente faz formação, mobilização, intercâmbio, organiza grupos… Então esse é um processo de construção coletiva”, disse.
Além da necessidade de aumentar os recursos para a Ater, os participantes listaram vários desafios. Entre eles, a busca da universalização do serviço de ATER, a melhoria da formação dos agentes de assistência técnica e dos “extensionistas” e um monitoramento mais eficiente das iniciativas de ATER. A maioria deles defendeu a criação do Sistema Unificado de Assistência Técnica e Extensão Rural (SUATER), ainda em discussão.
Clique aqui e assista à íntegra do webinar “ATER para uma transição justa dos sistemas alimentares”.
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