Texto

Notícias


Por Instituto Escolhas

25 março 2019

5 min de leitura

Artigo: As deficiências do Imposto Territorial Rural (ITR)

Um artigo publicado na Revista Debate Econômico em 2016 afirma que, apesar da extensão de seu território, o Brasil tributa pouco a propriedade rural. No texto, cujo título é “As deficiências do Imposto Territorial Rural (ITR)”, os autores Celina Gontijo* e Lincoln Frias** quiseram mostrar que o ITR não cumpre bem nem sua função fiscal (arrecadação) nem suas funções extrafiscais (estímulo ao desenvolvimento econômico e defesa da função social da propriedade).

 

Além disso, o levantamento oferece um panorama do sistema tributário brasileiro no geral, enfatizando o fato de que quase metade de sua receita provém de impostos indiretos sobre o consumo. Isso o torna bastante regressivo, isto é, faz com que as pessoas com menos recursos tendam a pagar proporcionalmente mais impostos quando na verdade elas possuem uma menor capacidade contributiva. Em outras palavras, a tributação direta brasileira tem uma progressividade muito pequena, incapaz de neutralizar ou minorar a tributação indireta.

 

É no contexto deste sistema tributário regressivo e dominado por impostos indiretos que o Imposto Territorial Rural (ITR) deve ser compreendido. Destacamos aqui alguns dos principais pontos do artigo, que você pode fazer download na íntegra ao final desse texto.

 

FOTO: DIDA SAMPAIO/ESTADAO

 

O ITR é historicamente um tributo de pouco retorno arrecadatório ao Estado, não em razão da capacidade contributiva dos proprietários, mas em razão da política de tributação e de arrecadação. De acordo com o texto publicado, entre 1964 e 1994 as alíquotas do ITR estavam previstas na Lei nº 4.504/64, o Estatuto da Terra, e eram muito baixas, variando entre 0,2 e 3,5%, dependendo da localização, condições sociais e produtividade da terra. Na década de 1990, a arrecadação anual estava em torno de 20 milhões de reais, valor inferior ao arrecadado com o IPTU em uma cidade do porte de Natal/RN, com 800 mil habitantes.

 

Os pesquisadores apontam dados da arrecadação anual total do Brasil no ano de 2015 que, embora tenha ultrapassado 1 bilhão de reais, a arrecadação com o ITR correspondeu apenas a 0,06% da receita tributária total (BRASIL, 2016), inferior à arrecadação de imposto semelhante na França e na Itália com 3%, no Chile com 4,5%, nos Estados Unidos e no Canadá com 5% e no Uruguai com 6% da arrecadação total.

 

Esses dados se tornam ainda mais impressionantes em razão da extensão territorial do Brasil: 845 milhões de hectares, dos quais 552 milhões seriam área tributável. Uma das principais razões apontadas para a baixa arrecadação com o ITR é justamente o desconhecimento do território governado. Somente com o Estatuto da Terra de 1964 foi feito o primeiro cadastramento dos imóveis rurais no país, sendo identificados imóveis que compunham uma área de 307 milhões hectares, portanto, bastante inferior à área total do país.

 

Para os pesquisadores, a existência do latifúndio em si não representaria um problema social, se este fosse produtivo e recolhesse tributação condizente com o patrimônio que representa. Havendo uma concentração tão grande da propriedade rural nas mãos de poucos, dever-se-ia obter uma arrecadação considerável do imposto, visto que a alíquota aumenta progressivamente com o aumento do tamanho da propriedade, mas não é isto que demonstram os dados de arrecadação do ITR, por causa de diversos problemas na gestão do tributo.

 

Valor da Terra Nua – A definição do ITR por declaração do proprietário da terra é apontado como decisivo para o grande percentual de evasão fiscal, principalmente quando se considera que o tributo, desde sua criação no século XIX, é calculado dessa forma e nunca houve uma fiscalização que verificasse a integralidade e veracidade das informações dos proprietários, seja em relação à extensão de sua propriedade, aos seus limites geográficos ou à sua utilização.

 

O Decreto Federal nº 6.433/08 criou o Comitê Gestor do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, mas não foi encontrado nenhum avanço na fiscalização ou arrecadação que possa ser atribuído ao trabalho de tal órgão (BRASIL, 2008). A Lei nº 10.267/01 criou o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais com o objetivo de unificar os cadastros mantidos pelo INCRA e pela Receita Federal (BRASIL, 2001). Mais uma vez, o recadastramento foi feito apenas com base em documentos e declarações dos contribuintes, sem um estudo estatal prévio do território brasileiro. Com o desconhecimento do território, estima-se que a União deixe de recolher R$ 2 bilhões por ano por meio do ITR.

 

Maior imposto para quem que pode pagar

 

Um argumento contrário ao aumento do rigor da arrecadação do ITR é que isso poderia prejudicar a produção agropecuária, pois seria um custo adicional a desestimular a atividade do produtor rural. Porém, visto que 75% das propriedades no país estão abrangidas dentro da faixa de isenção do ITR por causa do tamanho da propriedade, o aumento da eficácia iria recair sobre os grandes proprietários rurais, que possuem capacidade contributiva para suportar o ônus da tributação, e sobre os latifúndios improdutivos.  Assim, mesmo sem aumentar as alíquotas do imposto, as finalidades fiscais e extrafiscais do ITR já poderiam ser melhor alcançadas com a cobrança efetiva por meio da legislação existente.

 

Com os parâmetros atuais para cálculo do imposto, uma parte considerável do tributo devido não tem força executiva, não sofrendo o proprietário cobrança judicial ao não pagar o imposto. A cobrança efetiva do ITR não deve ser encarada como um prejuízo às áreas rurais. Poderia inclusive haver algum tipo de vinculação do imposto a melhorias da infraestrutura rural e/ou ambiental.

 

Para os autores do artigo, é inaceitável que, em um cenário onde metade da arrecadação tributária é proveniente de impostos sobre o consumo, indiretos e regressivos, a legislação do ITR tributa a propriedade considerando índices de produtividade baseados em tabela que não é atualizada há cerca de 40 anos.

 

Hoje o ITR é um convite à acumulação de terras, ao uso inadequado da propriedade e à sonegação fiscal, descumprindo de forma clara a finalidade social da tributação e da propriedade.

 

Acesse o artigo na íntegra aqui

 

Celina Gontijo* – Mestre em Gestão Pública pela Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG). Procuradora da Fazenda Nacional.

 

Lincoln Frias** – Professor do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG).

 

Em abril o Instituto Escolha lançou novo estudo sobre esse tema no Seminário ITR: justiça tributária, incentivos ambientais e o agro no Brasil

Já é possível acessar o estudo AQUI e conferir a cobertura completa AQUI

 

Leia entrevistas exclusivas e saiba mais sobre estudos e publicações do Escolhas em nosso boletim mensal

Assine o boletim do Escolhas

    Leia entrevistas exclusivas e saiba mais sobre estudos e publicações do Escolhas em nosso boletim mensal

    Assine o boletim do Escolhas